terça, 01 de abril de 2008
O Globo
A sobrepesca pode ter conseqüências sérias para árvores dos ecossistemas, como o Pantanal e a Amazônia, comprova um artigo da revista Nature, publicado por três brasileiros. Isso porque, apesar de pouco estudado, o papel dos peixes na dispersão de sementes é fundamental. Deles dependem até um terço da regeneração do Pantanal e metade do ciclo regenerativo de árvores amazônicas.
- Nas áreas inundadas da Amazônia, o igapó e a várzea, até 50% das árvores é disseminada por peixes e pelo fluxo da água. No Pantanal são 30% - explica por telefone o professor Mauro Galetti (Universidade Estadual Paulista-Unesp), da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, onde passa um ano em estágio sabático.
Ele e os colegas Camila Donatti (Universidade de Stanford-Califórnia) e Marco A. Pizo (Universidade do Vale dos Sinos) escreveram o artigo publicado na Nature, que nasceu de uma pesquisa de quatro anos e sete mil horas de observação e análise de animais realizadas por 30 colaboradores.
"A interação entre frutas e os peixes de água doce é provavelmente um dos sistemas de mutualismo mais ameaçados do mundo hoje", afirma o artigo.
Galetti diz que aves e grandes mamíferos são os principais objetos de estudo quando se procura estabelecer a importância animal na dispersão de sementes. E, dependendo do lugar, de 87% a 90% das árvores das florestas precisam dos animais para se renovar. Mas até recentemente os peixes não eram levados em conta.
- A chance de uma semente germinar e se desenvolver, sem que um animal a leve para longe, é mínima. Muitos frutos precisam que sua polpa seja removida. Também, quando cai no chão, fungos, patógenos, besouros predam a semente. Mesmo se conseguir germinar, perto da árvore maior, a pequena não vai sobreviver porque há uma competição pelos mesmos recursos, a água e os nutrientes - explica Galetti.
E se as "florestas vazias" (isto é, com número reduzidos de animais) já eram um problema, hoje o ciclo regenerativo das florestas também pode estar seriamente comprometido por conta dos "rios vazios".
- São dois problemas: retirar um número grande de peixes e retirar os peixes maiores. É legalizado, dentro de uma cota, pescar os peixes maiores, só que isso leva a uma população nanica. E os peixes maiores é que dispersam as sementes. Os menores apenas as predam - aponta o pesquisador.
Além da sobrepesca, a construção de barragens, a poluição, a retirada de peixes ornamentais e a introdução de espécies exóticas comprometem a população de peixes nos rios.