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quarta, 31 de dezembro de 1969

Geoparque da Bodoquena e Pantanal/UNESCO

Intenção de criação de Geoparque para Serra da Bodoquena e Pantanal é apresentada na 3ª Conferência Internacional da UNESCO sobre Geoparques (Alemanha)

O conceito de geoparque, pela UNESCO, é ainda novo, mas já tem possibilitado a constituição de redes fortalecidas, como a da Europa e a da Ásia, resultado do acelerado crescimento dessa nova modalidade de uso de áreas com relevante interesse geológico e geomorfológico.

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Um geoparque é uma área delimitada que apresenta atributos geológicos e paleontológicos de interesse para o entendimento da evolução da Terra. Agregam-se à visitação desses pontos, valores culturais com o objetivo de proporcionar o desenvolvimento social dessas regiões e despertar o interesse para uso mais racional dos recursos naturais.

A modalidade de geoparque não foi prevista na lei que regulamenta a criação de unidades de conservação no Brasil a fim de constituir o SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação, mas o Serviço Geológico do Brasil vem incentivando a sua criação.

A figura de geoparque assemelha-se mais a um roteiro geológico de visitação de uma área, com o objetivo principal de divulgar os conhecimentos sobre a geologia de uma região. Temos no Brasil algumas iniciativas de sucesso nesse sentido, como os Caminhos Geológicos da Divisão de Recursos Minerais do Rio de Janeiro, os parques do Varvito e Rocha Moutonnée em Itu e Salto (SP), alguns parques no Paraná e a Estrada Real de Minas Gerais. Nessa última modalidade, os valores históricos é que são ressaltados, mas é um bom exemplo de como um projeto integrado vem promovendo o turismo da região.

Na Europa já foram criados mais de 50 geoparques e na Ásia outro tanto. Na Austrália há alguns e no Brasil apenas um – o Geoparque Araripe, o qual recebeu o reconhecimento da UNESCO em 2006.

Um geoparque pode ser criado independente do reconhecimento da UNESCO, mas são claras as vantagens de se obter esse reconhecimento, assim o geoparque passa a ter um interesse internacional.

O conceito de geoparque é ainda pouco difundido no Brasil e nas Américas, até mesmo na comunidade geocientífica. É crescente o interesse e a necessidade de divulgação das geociências e sua realização através dos geoparques passa a ser uma interessante estratégia a ser construída no Brasil.

A criação do primeiro geoparque na Chapara do Araripe foi uma iniciativa do Governo de Estado do Ceará executada por professores da Universidade Regional do Cariri (URCA) com o fundamental apoio do Prof. Gero Hillmer da Universidade de Hamburgo (Alemanha), quem pela primeira vez trouxe o conceito de geoparque para o Brasil em 2004. A partir da criação desse primeiro geoparque é que se iniciou a difusão desse novo conceito no Brasil.

Existem inúmeras possibilidades de geoparques no território brasileiro, para isso, temos o significativo trabalho da SIGEP – Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleontológicos, constituídas por instituições ligadas ao setor mineral, geológico, patrimônio e meio ambiente, universidades e associações científicas. Essa comissão vem desde 1997 levantando o potencial geológico e paleontológico do Brasil e divulgando o mesmo através de publicações disponibilizadas em seu sítio na internet (www.unb.br/ig/sigep/). Pode-se dizer que essa iniciativa é o embrião da criação de geoparques no Brasil.

Propostas de criação de geoparques no Brasil encontram-se em processo no Estado de Mato Grosso do Sul (Geoparque Serra da Bodoquena – Pantanal), Minas Gerais (Geoparque Quadrilátero Ferrífero), Paraná (Geoparque Campos Gerais), Rio de Janeiro (Geoparque Búzios), mas há inúmeros outros para serem criados.

Por iniciativa do IPHAN – Instituto Brasileiro do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, foi dado início ao processo de criação do Geoparque Serra da Bodoquena-Pantanal, cuja proposta inicial foi apresentada na 3ª Conferência Internacional da UNESCO sobre Geoparks, que aconteceu entre 22 e 26 de junho de 2008 em Osnabröck (Alemanha). A proposta foi apresentada na sessão de “aspirantes a geoparques da UNESCO”, com apresentação de trabalhos muito preliminares até de geoparques já bem estruturados e com franca visitação turística.

Foram apresentados por volta de 35 trabalhos apenas relacionados a geoparques com interesse em obter o reconhecimento da UNESCO, e as apresentações do Brasil, para os geoparques Serra da Bodoquena-Pantanal (MS)  e Campos Gerais (PR), foram bem recebidas e impressionaram pela riqueza em informações geológicas e paleontológicas e diversidade de paisagens e culturas associadas.

A participação nessa Conferência foi de fundamental importância para melhor conhecimento do conceito de Geoparque e o motivo da grande profusão dessa modalidade no mundo todo. O Brasil encontrava-se bem representado, com quinze brasileiros, a maioria da comitiva do Governo do Ceará, que contou inclusive com a participação do Vice-Governador Prof. Francisco Pinheiro. Havia a proposta do Brasil sediar a próxima reunião da rede mundial de geoparques da UNESCO em 2010, o que acabou ficando para a Malásia. Mas o Brasil saiu com uma boa proposta, representantes da UNESCO solicitaram para no Brasil vir a ser organizada a reunião inaugural de uma possível rede de geoparques das Américas em 2009.

Ficou claro, no referido projeto, que o conceito de geoparque vem a ser um importante instrumento de gestão territorial e articulação entre as diversas modalidades de unidades de conservação e empreendimentos turísticos de uma região, em consonância com as demais atividades econômicas, principalmente as minerarias. De forma clara, a criação de um geoparque não vem “atrapalhar” o desenvolvimento econômico, mas sim possibilitar seu melhor planejamento com benefícios marcantes para as atividades turísticas, afinal, qual região turística que não gostaria de receber o reconhecimento da UNESCO e vir a se apresentada como pertencente a uma rede mundial de geoparques?

O interessante é que o conceito de geoparque é agregador, possibilita incluir qualquer interessado, seja individual ou institucional. O que preocupa, no entanto, é que necessita de uma boa equipe, não somente no processo de criação, mas sim na sua implementação e estruturação. Como foi comentado no encerramento da conferência, um geoparque não necessita de dinheiro e sim de pessoas, e pessoas com boas idéias, já que boas idéias atraem financiamentos.

Saímos do evento animados, mais convictos dos benefícios que um geoparque pode trazer para o Estado de Mato Grosso do Sul e do Brasil como um todo porém preocupados. Preocupados com a futura constituição da equipe do geoparque e definição de sua forma de gestão. Montar a aplicação a ser submetida à UNESCO, para pleitear o reconhecimento internacional, não é difícil, ainda mais frente ao potencial geológico e paleontológico da Serra da Bodoquena, Maciço do Urucum e Pantanal, mas apesar do trabalho de divulgação da proposta, não foi possível ainda sensibilizar sobre a importância de se ter uma bem estruturada equipe multidisciplinar de trabalho e que possa trabalhar com autonomia e com perspectiva de continuidade futura.

 Existe no Estado de Mato Grosso do Sul uma interessante estrutura de gestão e financiamento de pesquisa que é a FUNDECT, que funciona como fundação estadual de apoio à pesquisa, que inclusive obteve recursos federais para apoiar projetos de pesquisa, apesar de até hoje nunca receber o total de recursos previstos por lei, oriundos da arrecadação estadual.

Apesar dos poucos recursos disponíveis, a FUNDECT se solidificou e adquiriu o respeito e confiança da comunidade científica de Mato Grosso do Sul, principalmente em função de sua autonomia. Essa fundação é gerida por três diretores (um presidente, um científico e um administrativo) que são escolhidos pelo Governador através de listras tríplice organizadas por seu conselho deliberativo. Os diretores têm mandato de três anos, e continuam no cargo, mesmo após mudanças governamentais. E essa experiência poderia vir a ser estendida para estruturação do futuro geoparque de Mato Grosso do Sul.

Muito há de ser feito e o processo está apenas começando, mas já é um avanço importante procurar saber mais sobre a proposta de geoparque de Bodoquena, afinal, se não fosse boa, não estariam sendo criados tantos geoparques pelo globo terrestre.

Paulo César Boggiani (professor do Instituto de Geociências – USP), participou do evento com auxílio da FAPESP – Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Proc. 08/03642-5). Texto originalmente apresentado no Portal Bonito (www.portalbonito.com.br) em 27/06/2008.

COLUNISTA

Paulo Boggiani

boggiani@portalbonito.com.br

Paulo César Boggiani, Geólogo formado e com doutorado pela Universidade de São Paulo, foi professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e Diretor Científico da FUNDECT - Fundação de Apoio à Ciência e Tecnologia de Mato Grosso do Sul. Atualmente é professor do Departamento de Geologia Sedimentar e Ambiental do Instituto de Geociências da USP. Foi o coordenador do primeiro curso de formação de guias de turismo de Bonito.

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